quarta-feira, 23 de março de 2016
O povo pediu, mas Jesus disse: Não vai ter golpe! (leia antes de torcer o nariz)
quarta-feira, março 23, 2016 Posted by: Caminho em Big Field., 0 comments
Por
Hermes C. Fernandes
Havia
uma expectativa no ar. Todos comentavam entre si que finalmente
chegara o dia em que o Messias tão esperado adentraria
triunfantemente em Jerusalém; dirigindo-se ao palácio, deporia
Herodes, o rei fajuto, marionete do império romano. Um tal galileu
surgira na periferia, fazendo milagres, exorcizando demônios,
alimentando multidões. Além de tudo, tinha pedigree. Só poderia
ser Ele, o filho de Davi, que libertaria Seu povo do domínio romano,
e assumiria o trono do qual era herdeiro.
A
cidade estava em polvorosa. Munidos de ramos, todos dirigiram-se ao
portão principal para dar boas vindas ao que vinha em nome do
Senhor. HOSANA! Os tempos áureos voltaram! Viva o Filho de Davi!
De
repente, desponta no horizonte um figura doce, serena, montada num
jumentinho. Seus discípulos O precediam e engrossavam os brados de
hosana.
Acostumados
em assistir às paradas triunfais, em que reis e generais se
apresentavam montados em extravagantes corcéis, a imagem d’Aquele
galileu montado num jumento era, no mínimo, frustrante. Mesmo sem
entender direito o que acontecia, os brados de hosana se
intensificavam. Talvez aquilo fosse um recurso cênico, visando
identificá-lO com as camadas mais pobres e oprimidas da sociedade.
Ninguém podia supor que o jumentinho era emprestado.
Ao
atravessar o portão da cidade, todos imaginavam que Ele Se dirigiria
ao palácio, liderando o povo para um golpe de estado, mas em vez
disso, Ele toma o lado oposto, e Se dirige ao Templo.
Possivelmente
muitos pensaram que Ele faria uma breve escala no templo, a fim de
legitimar Seu motim, buscando apoio da casta sacerdotal.
Inusitadamente,
Sua feição é transformada. O galileu humilde montado num burrinho,
agora improvisa um chicote, adentra os pátios do templo, e de lá
expulsa os cambistas e mercadores.
Confusão
geral! Os brados de hosana foram substituídos por burburinhos. Todos
estavam enganados em suas expectativas. Ele não estava interessado
em ser unanimidade. Não buscava apoio dos sacerdotes, nem dos dos
principais partidos religiosos.
O
reino que Ele representava não propunha mudanças que começassem
pelo palácio, mas pelo templo. A Casa de Seu Pai estava sendo
profanada, transformada num mercadão a céu aberto. Antes de
instaurar a ordem do reino, aquela “ordem” teria que ser
subvertida. Mesas de pernas pro ar! Gaiolas abertas! Cambistas
expulsos!
O
mesmo Cristo do jumentinho é o Cristo do chicote. Não confunda Sua
humildade com passividade. Ele jamais fez vista grossa às injustiças
dos homens.
Depois
de limpar o terreno, cegos e coxos Lhes são trazidos, e Ele os cura
ali mesmo. De repente, o silêncio é quebrado por brados de hosana,
que desta vez vinham dos lábios de crianças.
Os
sacerdotes, indignados, perguntam se Ele não se incomoda com aquilo.
Jesus responde: Vocês jamais leram? Da boca das crianças é que sai
o mais puro louvor.
Repare
nisso: Os hosanas bradados à entrada de Jerusalém não mereceram
qualquer comentário de Jesus. Entretanto, Ele sai em defesa das
crianças que O louvavam com a mesma expressão. Por quê? Porque
estes eram legítimos, desprovidos de interesses. Os hosanas de quem
O recepcionou à porta da cidade foram interrompidos, tão logo Jesus
feriu seus interesses. Os mesmos lábios que O enalteciam, dias
depois clamavam por sua crucificação. Quão volúveis somos nós,
humanos. Num dia aplaudimos, noutro vaiamos. Quem hoje é
unanimidade, amanhã é execrado.
Aqueles
O louvavam por imaginarem que Jesus planejava um golpe político, e
que, em posse do trono, romperia relações com Roma, reduziria a
carga tributária, e restabeleceria a monarquia de Davi. Mas Jesus
tinha em mente outro tipo de revolução. Somente as crianças
estavam prontas para isso. Naquele momento, Jesus Se tornou no
super-herói da meninada.
Só
Ele teve a coragem de desafiar o status quo. Só Ele ousou enfrentar
os que detinham o monopólio religioso.
Enquanto
as crianças O louvavam, os adultos, indignados, já pensavam em como
detê-lO. Foi esta postura subversiva que Lhe custou a vida. Começava
ali a contagem regressiva para que o Cristo subversivo fosse morto,
não por defender uma ideologia, mas um ideal, o ideal do Reino de
Deus.
Desde
então, o grito de “hosana” deveria ter conotação subversiva, e
não ser mais um jargão religioso. Que seja o hosana das crianças,
dos representantes do futuro, aqueles para os quais é o reino dos
céus, e não o hosana dos interesses inconfessáveis, do monopólio,
da religiosidade insípida, do jogo político. É triste e revoltante
ver tantos cristãos deixando seus cultos dominicais portando ramos
nas mãos, sem com isso serem cúmplices de Deus na instauração do
Seu reino.
Que a
religião instituída desista de tentar domesticar Jesus. Que ninguém
se atreva a reduzir Sua agenda às nossas expectativas e paixões
ideológicas.
Aos
líderes evangélicos que fazem coro com o que há de mais
reacionário no atual cenário brasileiro, antes de saírem às ruas,
promovendo seus 'atos proféticos' para amarrar o principado da
corrupção, com seus comícios travestidos de cruzadas
evangelísticas, preparem-se para receber uma visita relâmpago de
Jesus em suas próprias igrejas. Assim como os cambistas
transformaram o pátio do templo num mercadão a céu aberto, muitos
estão transformando a igreja em curral eleitoral. O Cristo que
derruba mesas, também derruba púlpitos. Então, antes de apontar
seus dedos inquisidores para os de fora, tratem de parar de negociar
os votos de suas ovelhas ou induzi-las com seu discurso de ódio a se
posicionarem contra outros segmentos. Lembrem-se de que o juízo de
Deus sempre começa pela Sua própria casa, e ele será sem
misericórdia com os que não usaram de misericórdia com os seus
semelhantes.
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