quarta-feira, 29 de abril de 2015
Vingança, justiça e graça
quarta-feira, abril 29, 2015 Posted by: Caminho em Big Field., 0 comments
Philip Yancey em "Rumores de Outro Mundo"
Quando o mundo vê a graça em ação, fica em
silêncio. Mandela ensinou ao mundo uma lição sobre a graça quando, após ser
eleito presidente da África do Sul e depois de 27 anos de prisão, convidou seu
carcereiro a juntar-se a ele no palanque de posse. Então, convidou o arcebispo
Desmond Tutu para chefiar uma equipe do governo com um nome bastante imponente:
Comissão da Verdade e Reconciliação. Mandela procurou neutralizar o processo
natural de vingança que ele vira em tantos países, onde uma raça ou tribo oprimida
toma o controle da outra.
Durante os dois anos e meio seguintes, os
sul-africanos ouviram relatos de atrocidades chegando às audiências da Comissão
da Verdade e Reconciliação. As regras eram simples: se um policial, ou oficial
do exército, branco, enfrentasse voluntariamente seus acusadores, confessasse
seu crime e reconhecesse totalmente a culpa, poderia não ser julgado e punido
por aquele crime. Partidários de procedimentos mais duros reclamaram da
evidente injustiça de deixar criminosos sair livres, mas Mandela insistiu que o
país precisava muito mais de restauração que de justiça.
Em uma audiência, um policial chamado Van de
Broek relatou um incidente no qual ele e outros policiais fuzilaram um garoto
de 18 anos de idade e incendiaram seu corpo, virando-o sobre o fogo como um
pedaço de churrasco a fim de destruir qualquer evidência. Oito anos mais tarde,
Van de Broek voltou à mesma casa e capturou o pai do rapaz. A esposa foi
forçada a assistir a tudo, enquanto policiais amarravam seu marido a uma pilha
de madeira, jogavam gasolina em seu corpo e ateavam fogo.
A sala do tribunal ficou em absoluto silêncio
quando a mulher, já idosa, que perdera primeiro o filho e depois o marido, teve
a oportunidade de responder. O juiz perguntou: "O que a senhora deseja
para o sr. Van de Broek?". Ela disse que queria que Van de Broek fosse ao
lugar onde tinha queimado o marido dela e reunisse suas cinzas, de modo que ela
pudesse lhe dar um funeral decente. Cabisbaixo, o policial balançou a cabeça
concordando.
Então ela fez um pedido adicional: "O
senhor Van de Broek tirou minha família inteira, mas ainda tenho muito amor
para dar. Duas vezes por mês, gostaria que ele viesse ao gueto e passasse um
dia comigo, a fim de que eu possa ser uma mãe para ele. E gostaria que o sr.
Van de Broek soubesse que foi perdoado por Deus e que eu também lhe perdoo. Eu
gostaria de abraçá-lo, para que ele soubesse que meu perdão é verdadeiro".
De forma espontânea, algumas pessoas na sala do
tribunal começaram a cantar "Amazing Grace", enquanto a anciã se dirigia até
o local das testemunhas, mas Van de Broek não conseguiu ouvir o hino. Havia
desmaiado, pasmo com o que acontecera.
A justiça não foi feita naquele dia na África do
Sul, nem em todo país durante os angustiantes procedimentos da Comissão da
Verdade e Reconciliação. Ocorreu, sim, algo além da justiça. Paulo disse:
"Não se deixem vencer pelo mal, mas vençam o mal com o bem". Nelson
Mandela e Desmond Tutu compreenderam que, sempre que o mal é feito, somente uma
reação pode vencê-lo. A vingança perpetua o mal. A justiça o pune. O mal só é
vencido pelo bem se a parte ferida o absorve, recusando-se a permitir que siga
adiante. E assim funciona a graça sobrenatural que Jesus demonstrou em sua vida
e morte.
Não há nada que nos possa salvar
Nós, que merecemos morrer, precisamos de um milagre
W. H. Auden
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